Agora vai saber, se
no nosso final, não acaba alguma coisa mesmo dando certo, tipo brinde do cosmos.
— Tati Bernardis
Eu estava sentado à mesa,
me sentindo congelado enquanto meu coração palpitava forte no peito.
Não era possível.
Era difícil de acreditar,
mas parecia muito real.
Era uma brincadeira do
destino, mas aquela garota sentada ali, a nossa frente, era a louca que eu
tinha atropelado, a louca que eu tinha mandado flores com o celular dela de
volta no dia anterior.
Aquela louca era a
Mellissa.
— Mellissa, tudo bem? – A
Jô cumprimentou ela, eu ainda estava em choque olhando para ela sentada a minha
frente, pela primeira vez desde que quase a atropelei, ela não estava com a
feição de brava, nervosa, ou me xingando e querendo me matar, e pela primeira
vez eu podia olhar diretamente para ela, o que fez eu me surpreender ainda
mais, ela era excepcionalmente linda!
Ela desviou os olhos de
mim, sem dizer nada a meu respeito e olhou para a Joana, elas pareciam se conhecer.
— Tudo ótimo, e você?
Nossa, que surpresa! – Ela não pirou, ufa, nem me xingou, nem me insultou, nem
olhou feio para mim, ela estava agora praticamente me ignorando.
— Fico muito feliz que
tenha vindo, eu disse a Ana Paula o quanto o seu currículo era bom, pena que
não tenho nenhum aqui. – Sim, elas se conheciam, mas como?
— Ah, eu trouxe o Book. –
Ela riu, como se as duas já tivessem conversado sobre isso ou algo parecido
antes. Caramba, eu atropelei uma menina que a Jô conhece, se a Jô souber disso,
ela vai me matar, muito mais do que a louca, que aliás, é linda para caralho e
está sentada na minha frente me ignorando. – Meu Deus, eu não acredito! Como
você conseguiu o meu número?
A louca entregou o que
parecia uma pastinha azul para a Jô que a pegou, abriu e deu uma olhada
passando para a Ana Paula em seguida.
— Quando você deixou
comigo o Book e eu vi o quanto era bom, eu anotei o seu número. – A Jô deu uma
risadinha arteira e a menina sorriu, surpresa.
— Poxa, muito obrigado,
mesmo, obrigado pela oportunidade da entrevista também. – A Jô sorriu e olhou
para a Ana Paula que estava olhando o que elas chamavam de book, eu fiquei
pensando se era um book de fotos, ah eu adoraria ver se fosse ela em várias
poses, ela já era linda brava, e até mesmo sorrindo como estava na minha frente
agora, imagina em poses.
Poses sexys, talvez?
Tentei não rir com meu
pensamento e dei uma pigarreada, como quem diz, “Hey gente, eu estou aqui!”
A Jô me olhou, mas não
disse nada e a Louca não me olhou. Sim, ela estava me ignorando de propósito.
— Ah, acho que não nos
apresentamos direito, né? Meu nome é Joana, eu sou assistente pessoal e
assessora do cantor Luan Santana. – Agora ela me indicou com a mão, e dessa vez
a louca não pôde me ignorar, ela olhou para mim e deu um aceno com a cabeça.
Que filha da mãe, estava fingindo que não me conhecia.
Ótimo, se é assim.
A Jô continuou falando.
— E essa é a Ana Paula,
gerente do RH.
— Prazer. – A louca
respondeu, educada e simpática.
Ela parecia outra pessoa,
será que eu devia mencionar o quanto ela era capaz de ficar nervosa, te xingar
no meio da rua e quase afundar o capô do seu carro?
— Seu book é realmente
impressionante. – A Ana começou a dizer e eu estiquei a mão na mesa em direção
a Jô e a Ana, eu queria ver aquelas fotos, pelo amor de Deus, tem de biquíni
aí? Rsrsrs
A Ana percebeu meu gesto
e esticou sobre a mesa a pastinha fechada, eu a peguei e a abri, não era um
book de fotos, havia uma página de introdução a um book curricular, na página
seguinte, o currículo em si, muito bem elaborado.
Humm... Vinte e três anos,
solteira.
Formada em relações
públicas, comunicação social e jornalismo. Como alguém com vinte e três anos
consegue ser formada em três faculdades ao mesmo tempo?
Continuei lendo.
Estágio numa empresa
americana.
Morou em Nova York pouco
mais que oito meses.
Possui curso de
Photoshop, web design, gramatica avançada, SEO, literatura avançada, fluência
nas línguas inglês, espanhol, italiano e alemão.
Putaquepariu, a louca é
mais inteligente do que eu poderia sequer imaginar.
Soltei um assovio, sem
querer, de surpresa e ela ergueu os olhos e olhou para mim, erguendo as duas
sobrancelhas em desafio, como quem diz: “Sou burra demais para você?”
Que isso, eu que sou
burro.
A Jô estava conversando
com ela, mas enquanto lia o book eu não prestei a menor atenção, por isso,
fechei ele e deslizei sobre a mesa na direção da Jô, mas foi a Ana que puxou de
volta o currículo para olhar novamente.
— Foram mais ou menos
seis a sete meses, lá. O meu visto não permitia mais do que isso, e eu também
queria novas oportunidades em outras empresas, para aprender mais.
— Não quis ficar lá e
seguir carreira na empresa? Quem sabe até se mudar para os Estados Unidos,
aposto que é o sonho de toda jovem na sua idade. – A Ana Paula sabia ser meio
intimidadora nessas entrevistas, se alguém me entrevistasse assim, eu tremeria
na base.
— Não, ainda sou nova e
sei que terei outras oportunidades mais concretas para me fixar fora do país,
no momento, eu quero continuar no Brasil, quero poder aprender mais na minha
área, me especializar mais e com uma carreira sólida, daí sim, dar uma continuidade
fora do país, além do mais, os estágios internacionais raramente são
efetivados, é mais uma oportunidade de aprendizado e crescimento e para mim foi
muito valioso.
Ela não se deixou
intimidar pela Ana Paula. Mais um ponto para ela.
— Você nunca trabalhou
como assistente pessoal, né Mellisa? – Perguntou a Jô, apesar delas se
conhecerem, e eu não sei como, porque a Jô se apresentou aqui, mas elas
pareciam se conhecer, elas estavam conversando totalmente formais e
profissionais agora.
Incrível o que essas
mulheres são capazes de fazer.
— Não, minhas funções até
o momento foram voltadas para jornalismo e comunicação social, ainda não atuei
na área em si de relações públicas.
— Você acha que
conseguiria se dar bem nessa área?
— Provavelmente sim, fiz
três faculdades e então estou aberta a aprender as três profissões e pretendo
aprendê-las com eficiência.
— Por que três
faculdades? – Perguntou a Ana. Boa pergunta, por que uma pessoa quer tantas
faculdades ao mesmo tempo?
— São três faculdades que
de certo modo estão entrelaçadas, a comunicação social e Jornalismo é
basicamente a mesma coisa, ambas tratam da linguagem, notícias, mídia,
comunicação, o mundo em tempo real, e relações públicas é uma ponte entre a
comunicação social e o Jornalismo, mas quando você cursa uma faculdade de cada,
você aprende muito mais porque são uma união ao todo, mas tem parâmetros
diferentes, foi por isso que quis fazê-las ao mesmo tempo, mas separadamente,
assim ampliei meu leque de profissões e meu conhecimento, ao mesmo tempo.
Eu estava boiando na
entrevista mais uma vez, como sempre. Queria mudar isso, queria falar com ela,
ver como ela reagia ao ouvir minha voz, ao olhar para mim, mas eu não tinha
nada a perguntar até então, as perguntas das duas eram muito profissionais para
eu me meter.
— Você tem fluência mesmo
em quatro línguas? – A Ana era impiedosa, cara.
A louca riu e assentiu
com a cabeça.
— Sim, inglês, espanhol,
italiano e alemão, e agora estou iniciando francês. – Acho que eu não fui o
único a abrir a boca.
— Meu Deus! Mas por que
tantas línguas? Você é fanática pelo conhecimento?
Ela riu, mais uma vez.
— Adoro línguas
diferentes. – Humm... eu também. Rsrsrs. – E também ajuda na minha profissão,
se eu virar repórter, posso viajar para qualquer país e falar fluentemente sem
problemas. Se eu virar assessora de alguém importante que viaja para o
exterior, não precisaremos de interpretes. E também dá um gostinho dizer que
você sabe falar tantas línguas, né.
A Ana e a Jô riram e
concordaram, eu não podia deixar passar minha única oportunidade de falar com
ela diretamente.
— Você era CDF na escola?
– Ela virou o rosto e olhou para mim.
Até que enfim, ela olhou
para mim!
Estava cansado de ser
ignorado já.
— Pareço ser CDF? – Ela
ergueu uma das sobrancelhas e eu pensei: “Definitivamente não, você parece a
gostosa do colégio que todos os caras querem pegar.”, mas apenas respondi.
— Talvez uma Hermione
Granger. – Ela riu e assentiu com a cabeça.
— Quem me dera, ela ainda
ganha de mim, mas obrigado, isso para mim foi um elogio. – Ótimo, ela era fã de
Harry Potter?
Ela me deu uma olhada
novamente e voltou a olhar para as meninas.
Ela estava fingindo que
não me conhecia, que nada tinha acontecido, e nos demais momentos ela estava me
ignorando.
Eu estava ficando confuso
com tudo aquilo.
Mas pelo menos ela olhou
para mim, e naquele milésimo de segundo, eu vi os olhos dela brilharem.
De raiva ou de desejo?
Rsrs
Aquilo tudo estava
começando a ficar muito, muito interessante, se pedissem meu voto para
contratá-la, meu voto era SIM, com certeza absoluta.
Eu queria ver como ela
iria reagir quando soubesse que iria trabalhar diretamente comigo.
Eu não podia acreditar
naquilo tudo, não podia acreditar que a mulher que tinha me ajudado no banheiro
da rádio, era assessora do Luan Santana, e que o Luan Santana era mesmo o
idiota que me atropelara, e que agora eu estava sentada em frente a ele, e ela,
fazendo uma entrevista, porque ela viu o meu book no banheiro, achou muito
interessante e anotou meu número sem eu nem ver.
Aquilo era demais.
Eu nem sabia mais se era
sorte ou azar tudo aquilo.
— Ah, aproveitando a
entrada do Luan na conversa. – A Ana parecia legal, mas ela sabia ser bem
intimista na entrevista, e parecia o tipo de pessoa que você não queria ver
brava.
— Eu só estou aqui porque
a Jô pediu. – Se defendeu o Luan, aos risos, e a Joana deu um tapinha de leve
no braço dele, como se o tivesse censurando, mas para mim, pareceu
brincadeirinha.
— Você conhece o Luan? –
Aí Deus, que pergunta! Eu não posso dizer que ele é o idiota que me atropelou,
ou posso?
— Se eu o conheço? –
Devolvi a pergunta. – Estou conhecendo agora. – Dei um sorrisinho para ele, sem
vontade, e voltei os olhos para a Ana que deu uma risadinha e emendou.
— Acho que perguntei
errado. Você é fã dele?
— Não. – Respondi de
cara. Eu conhecia ele, tecnicamente, sabia quem ele era, sabia que ele era
cantor, sabia que 99 em cada 100 meninas morriam por ele, sabia que ele estava
em todos os programas de televisão o tempo todo, e sabia uma ou outra música
dele que tocava nas rádios, isso quando
eu ouvia rádio, ou seja, eu sabia quem era o cara, mas isso nunca me fez fã
dele, eu não era fã dele, a Julia por outro lado...
Ele me olhou e ergueu uma
das sobrancelhas, eu devolvi o olhar, séria por um segundo e voltei o olhar a
Ana que emendava outra pergunta.
— Conhece as músicas
dele?
— Hum... – Pensei um
pouquinho. Eu não ouvia rádio, então não sabia o que ele andava cantando.
Tentei pensar em alguma música que ele cantava e arrisquei, meio indecisa. —
Amar não é pecado?
— Meu Deus! Essa é
antiga! – Ele disse e soltou uma risada alta. Eu olhei para ele e dessa vez foi
eu que ergui a sobrancelha. Olhei para a Ana esperando uma posição dela.
— Só conhece essa?
Eu dei de ombros.
— Desculpa, eu não ouço
sertanejo, não gosto de ouvir rádio e raramente assisto televisão em canal
aberto, só assisto filmes e séries americanas, então eu não faço ideia do que
ele esteja cantando no momento, eu só sei que ele tem uma multidão de fãs e
todo mundo conhece ele.
A Ana ergueu as sobrancelhas,
impressionada ou decepcionada? Não faço ideia.
Desviei os olhos para ele
e ele estava também com as sobrancelhas erguidas.
Pensei que fosse a Ana em
perguntar alguma coisa, mas foi ele.
— Você mora nesse
planeta? – Revirei os olhos e ignorei ele, voltando a atenção para a Joana e a
Ana Paula que estavam se entreolhando, pareciam ter uma conversa silenciosa.
— Jô, você quer explicar
um pouquinho o que a assistente faz? – A Ana não comentou mais nada sobre
aquele assunto e eu voltei os olhos para a Joana.
— Ah sim. – A moça que me
ajudou chamava Joana, era bem simpática, mesmo agora agindo mais profissional,
eu sabia que o fato dela ter visto o meu drama e me ajudado no banheiro não
garantiam o meu emprego, mas eu tinha gostado ainda mais dela agora. – Toda a
agenda do Luan é fechada por uma equipe, eles recebem as propostas de shows, ou
programas, entrevistas, enfim, e repassam para mim, eu sou responsável por
verificar com o Luan se sim ou não, raramente ele fala não para alguma coisa,
exceto em épocas de férias, para compromissos nessa época nós realmente
sentamos e fechamos a agenda juntos. Damos o Okay para a equipe que fecha os
compromissos e eles repassam para mim as datas e horários, e assim, montamos a
agenda do Luan. Eu sou responsável por todo o resto a partir daí, com a agenda
pronta, sou eu que guia ele para cada compromisso, os horários que deve chegar,
o horário que deve sair, em caso de shows, sou eu que tenho que verificar com a
equipe se o hotel foi fechado, local, segurança, transporte, sou eu a
responsável por guiar ele nas entrevistas e assessoria de relações públicas em
eventos, shows e tudo mais. Sem mim, ele não sai de casa, simples assim.
UAU.
E... Ai não!
Não me diga que a vaga é
para ser assessora dele?!
Assenti com a cabeça e
dei uma olhadinha para ele, ele estava me olhando e dessa vez eu vi um brilho
nos olhos dele, e nos lábios ele tinha um sorrisinho, um sorrisinho de quem
diz: “Você vai ter que me aguentar vinte e quatro horas por dia, está bom para
você?”
NÃO.
Alguém me acorde desse
pesadelo, por favor!
Eu não podia aceitar
aquela vaga nem que a vaca tossisse, falasse, fizesse acrobacias, balé e
sapateado ao mesmo tempo.
Não podia trabalhar ali.
Não com ele.
— O que você acha? –
Indagou a Ana Paula vendo a minha cara de assustada, eu não estava assustada
com o trabalho, ah não, meu problema era outro, totalmente diferente. O
problema era quem eu iria assessorar.
— Parece bem desafiador,
mas na prática, parece fácil, depois que pega o jeito da coisa, tudo praticamente
deve andar num ritmo só.
A Joana assentiu com a
cabeça.
— Exatamente, eu já tenho
meu jeito de trabalhar, de coordenar tudo, de verificar tudo, e o Luan só me
segue. Né, Lu? – Ela olhou para ele e sorriu, carinhosamente, ele sorriu de
volta e me olhou, erguendo uma das sobrancelhas.
— Eu só sou o fantoche. –
Ele disse e a Joana riu, balançando a cabeça de leve como quem não concorda,
mas não disse nada.
— Me perdoe perguntar,
mas a vaga seria para o quê exatamente? Se você já é a assistente pessoal e assessora
dele.
— A vaga é para o meu
cargo mesmo, assistente pessoal e assessora do Luan. Inicialmente ficaria
comigo aprendendo tudo que eu faço, detalhe por detalhe, depois eu iria te passar
aos poucos até que você conseguisse fazer tudo sem mim, depois disso, eu vou
pegar umas férias. – Nessa hora o Luan riu.
— Férias com dores de
parto e choro de bebê por seis meses. – Ela deu um tapa de leve no braço dele e
os três na mesa riram.
— Licença maternidade. –
Ela me explicou, e eu assenti. — Eu tenho seis meses de licença, mas o Luan,
caridoso, me deu um pouco mais de tempo. Assim que você estiver bem treinada,
com uns sete meses de gravidez eu me afasto e volto quando o bebê tiver uns
sete meses, vai dar um total de dez meses para você, quando eu voltar, você
continua fazendo a mesma coisa, e eu vou ficar por trás do processo para te
ajudar um pouco mais, garantir que tudo esteja certo, hotel, seguranças,
transportes, e tudo mais, mas vou ficar quietinha no escritório. Ai que
delícia!
— Estou sentindo que ela
tá louca para se livrar logo de mim, você sentiu isso, Ana? – O Luan disse,
brincando, e a Ana gargalhou, a Joana apertou as bochechas dele, rindo e ele
fez uma careta de mal-humorado, antes de rir junto com elas.
— Claro que não, bobinho,
só quero te dar uma assessora nova.
Eu dei uma risadinha,
engolindo em seco em seguida.
Ele estava me olhando agora
com um sorrisinho irônico nos lábios.
Filho da mãe.
— Então é para ser
assistente pessoal do Luan Santana? – Eu perguntei, sentindo o gelo percorrendo
minha espinha.
Eu não podia pegar aquela
vaga nem morta.
Eu não ia passar mais de
um ano trabalhando DIRETO com esse otário. Não, não com ele que acabou com meu
dia ontem, não com esse babaca, otário, que me chamou de louca, riu de mim, e
depois mandou um buque de flores com um debochizinho no final.
Ah não.
— Isso. Conseguindo a
vaga você terá acesso a qualquer lugar que ele for, obviamente, não paga hotel,
nem alimentação, nem nada enquanto estiver com ele ou a trabalho, os voos são
no avião particular dele, além disso você tem um valor mensal de alimentação de
mil reais em dinheiro, ajuda de custo de três mil mensais, vai ganhar um carro
da empresa que poderá ficar com você direto, com vale combustível, sem
descontos para você, assistência médica, odontológica, bonificação de final de
ano...
— Adoro as bonificações!
– Disse a Ana Paula e eu olhei para ela, que estava sorrindo, sonhadora. – Ano
passado ganhei férias de dez dias na Disney com tudo pago, eu e minha família.
— Gostou, Ana?
— Amei, Lu, Obrigado! A
Bia passou quase um mês vestida de Minney! – Ele sorriu, parecia realmente
feliz ao ouvir aquilo, eu não disse nada.
— E o salário. –
Continuou a Joana. – É de quatro mil reais, inicialmente enquanto você é minha
aprendiz. Quando passar a assistente sozinha, passa a ganhar dez.
Eu senti minha boca se
abrindo ligeiramente.
Eu ouvi direito?
Dez mil reais?
Dez mil, mais mil reais
de alimentação, mais três mil de ajuda de custo, um total de quatorze mil reais
para andar ao lado desse otário vinte e quatro horas por dia com tudo pago, mais um carro?
PUTAMERDA.
Quase quinze mil reais
mais um carro livre para mim!
Eu não podia recusar essa
vaga nem que a vaca desse um salto triplo carpado.
Mas eu iria trabalhar com
ele vinte e quatro horas por dia!
Ai, Senhor!
Engoli a seco e olhei
para ele, acho que eu parecia apavorada, ele me olhou e sorriu, aquele sorrisinho
sacana, e eu afundei por dentro.
Se me oferecessem a vaga,
o que eu iria fazer?
A entrevista acabou depois
de mais algumas perguntas e a Ana e a Joana disseram que iriam avaliar o
processo seletivo e davam uma resposta para ela em até dois dias, caso ela
conseguisse a vaga, começava na segunda-feira que vem. A Ana e a Jô se
levantaram e seguiram em direção a porta, eu demorei um pouco mais para me
levantar, vendo a louca pegando a bolsa e colocando no ombro, ela deu uma
olhada para mim e eu dei um sorrisinho o que fez ela fechar mais a cara e virar
o rosto.
A Ana e a Joana estavam
mais à frente conversando enquanto iam saindo da sala, eu segui devagar até a
porta e a segurei, esperando a louca passar por mim, quando ela passou ao meu
lado eu disse, baixinho.
— Gostou das flores? –
Ela virou o rosto e me olhou, os olhos me fuzilando, ótimo, ela voltou a ficar
brava comigo e pelo jeito não tinha gostado das flores. O que eu fazia para
essa garota parar de ser tão ‘Capitão nascimento’ assim?
— Muitíssimo obrigado por
devolver o que é meu. – Ela disse, baixo e seco, e eu soltei uma risada sem
conseguir controlar.
— De nada! E quanto ao
jantar? Ou eu desconto do seu salário quando você for contratada? – Eu sei que
ela era a fúria em pessoa, mais brava que um pittbull, mas eu confesso, adorava
ver ela bravinha daquele jeito, era como um desafio, como se acendesse algo
dentro de mim além do alerta vermelho. Eu não tinha medo do perigo.
Era obvio que eu estava
brincando com ela, se ela levou a sério ou se não gostou de me ver zoando ela,
demonstrou isso muito bem, ela parou e me olhou, cerrando os dentes e me
fuzilando com os olhos.
— Sabe quando eu vou
jantar com você? Só no dia que o Michael Jackson voltar dos mortos e dançar
Triller sendo preto novamente.
— Ui. Essa doeu. – Eu
disse, brincando, colocando a mão no coração e ela bufou, irritada, saindo pisando
duro pelo corredor. Eu corri atrás dela.
— Mas se a Jô te
contratar, nós, com certeza, vamos jantar muitas vezes juntos. – Eu dei uma
piscadinha para ela e ela negou com a cabeça.
— Isso está fora de
questão.
— Diz logo que você está
louca para jantar comigo, eu sei que está! – Eu estava cutucando a onça com
vara curta.
— Se eu puder te
envenenar durante o jantar, com prazer eu iria jantar com você. – Eu soltei outra
risada, o que fez a Joana, que estava mais à frente caminhando ao lado da Ana,
se virar e nos olhar.
Epa, sinal de alerta
máximo, aquele olhar não era nada bom.
— A gente se vê em breve,
Louca. – Eu disse, rindo, e segui caminhando mais apressado a frente, passando
pela Jô e pela Ana e seguindo até a área de café, louco por um chocolate quente
da máquina expressa.
Eu vi a Ana passando com
a louca em direção a recepção e peguei uma xicara preparando meu chocolate,
enquanto esperava o chocolate ficar pronto a Jô se aproximou de mim e parou, de
braços cruzados.
— Você conhece a Mellissa?
– Eu disse que era alerta máximo, não disse?
— Acabei de conhecer. –
Eu disse, indicando com a cabeça o corredor onde ficava a sala de onde tínhamos
acabado de vir.
— E por que estava
conversando com ela e rindo? – Ela ainda estava de braços cruzados e agora
erguia uma das sobrancelhas. Perigo total.
Eu não podia deixar a Jô
saber que eu tinha atropelado a garota, então, inventei uma desculpa qualquer
enquanto me virava e pegava a xicara de chocolate quente, já pronto.
— Estava fazendo uma
piadinha só para ver como a menina reagia, Jô, ela parecia séria demais, só
isso.
— Luan, eu vou contratar
aquela garota, portanto, eu espero que você se comporte e não se enrabiche para
o lado dela.
— Se enrabiche? Que isso?
Tá parecendo a minha mãe. – Eu disse, rindo, segurando a xicara de chocolate
quente na mão que estava tão quente que quase queimou meus dedos. – E aquela
outra antes dessa? Eu gostei dela.
Eu queria que a Mellissa
com nome estranho e que eu chamava mentalmente de louca fosse contratada, por
isso, estava usando a lei da inversão, se eu demonstrar interesse demais nela,
a Jô não vai contratá-la.
— Eu e a Ana já
decidimos, é a Mellissa. Por favor, me promete que vai se comportar! – Eu
soltei uma gargalhada. – Eu vi o jeito que você olhou para ela, Luan!
— Relaxa, Jô, eu não vou
me enrabichar para ela, ou seja lá o que isso signifique.
— Você sabe muito bem o
que significa. – Eu dei uma piscada para ela e entreguei a xicara de chocolate
na mão dela, que sorriu, agradecida, e tomou um gole, eu voltei-me para a
máquina e coloquei outra xicara lá para fazer outro chocolate quente, dessa vez
para mim de verdade.
— Além do mais, ela não
parece flor que se cheire. – E não era mesmo, eu sabia disso.
— Exato, é por isso que
nós vamos contratá-la, ela parece ser firme o bastante para te colocar no seu
lugar.
Com certeza ela era firme
o suficiente até para me mandar para o inferno... opa, eu acho que ela já tinha
feito isso antes.
— Me colocar no meu
lugar? Me senti uma criança arteira agora. – Dei uma risada e a Jô revirou os
olhos, bebericando o chocolate quente dela; ela se aproximou de mim e colocou
uma das mãos no meu ombro.
— Você está livre agora,
amanhã você só precisa ir no estúdio e trabalhar um pouco nas músicas novas,
Okay? Depois está livre. – Eu abri um sorriso imenso o que fez ela sorrir em
seguida. Dei um beijo no rosto dela e senti a mão dela acariciando meu rosto.
— Obrigado! Você é a
melhor assessora do mundo! – Ela soltou uma gargalhada e saiu caminhando em
direção a sala da Ana, bebericando o chocolate quente que eu havia dado para
ela.
Eu peguei o meu na
máquina e me sentei num dos sofás de couro branco, cruzando as pernas e tomando
um gole do chocolate quente que me aqueceu completamente por dentro, enquanto
eu ficava pensando na louca; eu precisava parar de chamar ela de louca ou a Jô
desconfiaria, e eu precisava parar de provocar tanto ela, mas isso seria quase
impossível, eu gostava de ver ela nervosinha, ela me dava uma patada ou uma
resposta seca e me fazia rir, e me fazia sentir vontade de irritar ela ainda
mais, aquele joguinho era muito divertido, e me atiçava como ninguém tinha
feito antes.
Fora isso, ela era
absurdamente linda, Deus do céu, se ela não fosse tão brava, nervosa,
irritante, fria como gelo e afiada como uma faca, quem sabe eu realmente
fizesse o que a Jô estava morrendo de medo e me enrabichasse para o lado dela?
Mas aquilo ia ser impossível, eu adorava irritar ela, mas ela era louca demais para
mim, e com o novo Status de relacionamento, eu nem queria saber de mais
loucuras para mim.
Terminei meu chocolate e
resolvi ir embora aproveitar minha noite de folga.
Eu estava tremula, desde
que sai daquele prédio até chegar à rádio onde a Ju trabalhava e onde eu tinha
visto aquele otário ontem, eu sabia que falar tudo aquilo para a Ju só a faria
ficar histérica e tudo mais, mas eu precisava urgentemente falar com alguém, e
ela era a pessoa mais apropriada para isso, uma vez que já conhecia o drama inteiro.
Quando cheguei na rádio,
mandei uma mensagem para ela avisando que já estava na portaria e que ficaria
ali mesmo esperando-a para sairmos. Era terça-feira, mas mesmo assim, eu a
convidei para irmos tomar uma cervejinha num barzinho ali na Paulista, eu
precisava de um litro inteiro de pinga para acalmar meus nervos e ver se eu
conseguia parar de tremer tanto.
Quando ela chegou na
portaria, me abraçou, dando um beijinho no rosto (ela sempre fazia isso com
todo mundo que ela conhecia, mesmo sendo melhor amiga que ela via dez vezes por
dia ou um coleguinha, ou alguém que ela acabou de conhecer), então seguimos
pela calçada no meio das pessoas, caminhando lentamente e eu tentando não
tropeçar nos meus pés trêmulos de um corpo mais tremulo ainda.
Já eram quatro e meia e a
Avenida começava a ficar mais agitada que o normal à medida que o horário de
pico se aproximava. Eu não precisei falar nada sobre mim inicialmente porque a
Ju estava cheia de novidades para me contar.
Espere até ela ouvir as
minhas.
— Você não vai acreditar.
– Ela começou, eufórica. – Aquele otário me ligou, me ligou umas quinhentas
vezes hoje até eu atender, me mandou um milhão de mensagens no Whatsupp.
— Achei que você tivesse
terminado com ele.
— E terminei, amiga, por
isso ele ficou igual uma carniça em cima de mim. Ai que raiva! – Pensei que ela
ficaria feliz com um monte de telefonema do cara, sinal de que ele se importava
mesmo com ela e talvez ela estivesse errada sobre ele.
— Calma, Ju, e começa do
começo. Ele te ligou por que?
— Começou logo cedo me
mandando mensagem, pedindo perdão, disse que realmente gostava de mim e de estar
comigo, que eu era diferente, e que ele queria muito tentar algo mais sério
comigo. HAHAHA. Patético, eu não acreditei, é claro. E nem respondi.
— Coitado. – Eu disse,
baixinho, mas ela ouviu e me olhou, revirando os olhos em seguida.
— Coitada é de mim, Mel,
de aguentar esses babacas que acham que eu sou idiota de acreditar em tudo que
eles dizem.
— E daí? O que aconteceu
depois?
— Ele ficou mandando mais
um monte de mensagens, eu só visualizava e não respondia. Lá pelo meio dia ele
começou a me ligar, e ligar, e ligar, e ligar. E eu não atendi.
— E por que não?
— Para ouvir aquele mesmo
papinho furado? Não. Dispenso. Ele ficou ligando até as três da tarde até que
eu mandei uma mensagem para ele falando para me deixar em paz e arrumar outra
otária porque eu já era. Acabou, baby.
Eu dei uma risadinha,
agora que o cara não ia desgrudar dela mesmo. Sabe aquela típica coisa de
quando alguém pisa a pessoa vem correndo atrás? Então, homens são assim,
praticamente 90% dos homens que a Ju terminou desse jeito ficaram que nem
loucos atrás dela depois, acho que eles se apaixonam por quem pisa neles. Só
pode.
— Ele respondeu,
obviamente.
— Não.
— Não? – Eu virei o rosto
com tudo e encarei ela, impossível ele não ter respondido.
— Pior que isso. Ele me
mandou um buque de flores e começou a ligar novamente.
— HAHAHAHA. – Eu caí na
gargalhada e ela fez uma cara de derrotada. – E lá vamos nós mais uma vez
nessa. É o milésimo que faz isso quando você termina.
— Eles gostam de sofrer,
eu sei. Mas eu adorei as flores! Eram tão lindas, Mel! Coloquei num vazo na
minha sala. – Eu ri de novo, dessa vez com mais vontade ainda; ela se fazia de
difícil, mas gostava do cara.
— E você atendeu ele?
— Antes de você chegar,
sim. Acho que ele estava trabalhando com o celular colado no dedo né? -
Coitado, ia sofrer muito ainda, ele não sabia onde estava amarrando o burro
dele.
— E o que ele disse?
— Me convidou para sair e
tomar alguma coisa, para podermos conversar, e eu disse que já tinha
compromisso, que ia beber com uma amiga, ele implorou por uns cinco minutos e
eu disse que sem chance, eu já tinha combinado com uma amiga e não ia trocá-la
por um otário que pensa que eu sou idiota.
— Ai, essa doeu. – Ela
riu. Estávamos chegando ao barzinho que gostávamos de ir.
— Concordamos em
conversar, quinta à noite, porque amanhã eu tenho aula de ioga.
— Pensei que o seu Ioga
fosse as sete e meia.
— E é, mas ele não
precisa saber, falei que era meia noite. – Deixei escapar uma risada alta e ela
riu junto, estava se fazendo de difícil. – E disse que se ele ficasse me
ligando o dia inteiro amanhã de novo, eu não ia a lugar algum nunca mais. Ele
não me deu paz, mal consegui trabalhar, que isso.
Eu queria ser como a Ju,
saber ser fria mesmo gostando ou sentindo alguma coisa, nunca soube ser assim,
sempre fui a idiota melosa, derretida, que demonstrava demais, cedo demais, e
se ferrava, cedo demais também.
Finalmente chegamos ao
barzinho, sentamos numa mesinha de dois lugares perto da calçada e pedimos uma
cerveja e dois copos, acompanhado de uma porção de batatas-fritas.
— Desse jeito ele vai
ficar apaixonado por você e depois você não vai conseguir se livrar dele. – Eu
disse enquanto colocava a bolsa na beirada da cadeira e relaxava na cadeira já
me sentindo mais calma, se focar nos problemas dos outros era uma boa maneira
também de esquecer os próprios problemas.
— Eu vou dar mais uma
chance a ele, amiga, mas só vou deixar ele saber disso depois que ele realmente
ficar apaixonado e louco por mim.
— Então ele ainda vai
sofrer um pouquinho.
— Ah vai. – Nós rimos e o
garçom chegou trazendo a cerveja e dois copos. Ele serviu os copos e saiu, e eu
peguei meu copo dando uma golada e saboreando-o momentaneamente, como um
viciado que dá a sua primeira cheirada depois de um longo tempo de recesso.
Maravilhosa aquela
sensação.
Quase ri de mim mesma e
voltei a atenção a Ju que continuava falando.
— ... um pouquinho não
faz mal a ninguém, e homem só dá valor quando vê que a gente não está nem aí
para eles, então, fazer o que, vai ser assim.
— Eu preciso aprender a
ser como você, Ju. Tenho que parar de ser mole demais. – Ela estava virando um
gole da cerveja dela e concordou com a cabeça.
— Você sabe que é só me
pedir conselhos e seguir eles e não tem erro. – Ótimo, então vamos começar com
eles.
— Falando em conselhos,
acho que preciso mesmo de um.
Ela soltou uma gargalhada
e assentiu.
— Chora amiga, sou toda
ouvidos.
— Você não vai acreditar,
e depois vai pirar.
— Ai meu Deus. Ele foi na
sua casa? – Eu soltei uma gargalhada, eu sabia que ela ia associar a frase ao
idiota. Neguei com a cabeça e ela ficou me olhando, curiosa. – Fala logo, vai
me matar de curiosidade desse jeito.
Tomei um novo gole de
cerveja antes de começar o relato.
— Fui fazer uma
entrevista hoje, e uma das mulheres que me entrevistou, é aquela do banheiro de
ontem, que me ajudou...
— Não brinca! Sério? –
Assenti com a cabeça, continuando.
— Ela disse que pegou meu
número no book porque gostou do meu currículo. O mais louco nem é isso, o mais
louco é que, quando eu cheguei para a entrevista, ela estava lá, e advinha quem
estava lá também?!
Ela colocou a mão na boca
e negou com a cabeça, falando com a voz abafada.
— Nãoooo! Tá falando
sério? É mesmo quem eu tô pensando? – Eu assenti e ela arregalou mais os olhos.
– Amiga!
— Aquele idiota estava
lá.
— Como assim? Por que ele
estava lá?
— A moça que me ajudou trabalha
para ele, a empresa que eu fui fazer entrevista é “dele”... – Ela foi
arregalando mais os olhos, se é que isso era possível, e então eu fechei com
chave de ouro. - E a vaga... é para ser assistente pessoal e assessora dele.
— AI MEU DEUS! – Ela
falou tão alto que todo mundo no bar virou e olhou para nós. Eu podia ter
censurado ela, mas soltei uma risada alta no lugar disso.
Era mesmo muito absurdo.
— Eu sei, é um absurdo.
Eu não acreditei também, é muito...
— Coisa do destino. – Ela
disse e eu revirei os olhos, rindo, zombeteira.
— Destino? Coisa do azar
mesmo né, você quer dizer.
— Amiga, primeiro você é
atropelada por ele, depois uma mulher te ajuda no banheiro, e a mulher trabalha
para ele, e te chama para uma entrevista, para ser assistente pessoal DELE? Se
isso não for destino, eu não sei o que é então.
Isso se chama azar ao
cubo, elevado a potência máxima da raiz quadrada, ou sei lá mais o que porque
eu não fiz faculdade de matemática, e não entendo nada de contas, mas era isso
aí.
— Isso se chama tirar o
azar grande. – Eu disse, brincando e rindo e ela me lançou uma cara feia. – O
pior é que eles vão pagar bem para CARALHO nessa vaga. Você não vai acreditar.
— Depois de tudo isso que
você disse, sim, eu vou acreditar. – Eu ri. O garçom voltou trazendo a nossa porção
de batatas-fritas e eu roubei uma, saboreando-a, antes de continuar.
— Depois que pegar o
cargo efetivamente, o salário total vai para quinze mil reais.
A Ju engasgou com a
batata que ela tinha acabado de colocar na boca, e engoliu rapidamente antes de
dizer, incrédula.
— QUINZE mil reais? Meu
Deus do Céu, só para ficar do lado dele? Eu quero, pelo amor de Deus, me indica
para essa vaga se você não quiser. – Eu revirei os olhos.
— Não contratam fãs do
cara, me fizeram um monte de perguntas sobre ele e eu mal sabia que música ele
cantava.
— Se forem contratar quem
odeia ele, o cargo é seu. – Eu soltei uma risada e concordei com a cabeça,
pegando outra batata e colocando na boca, mastigando lentamente, pensativa,
enquanto pegava o copo para virar um novo gole de cerveja.
— Não posso recusar um
salário desses, mas trabalhar direto com ele, Ju, eu não sei se vou conseguir.
— Quem ouve você falando
pensa que, ou que você vai trabalhar com o ex namorado, ou ex marido, ou então
que você vai trabalhar com um assassino em série, maníaco e psicopata.
Era quase isso tudo
junto.
— Mais ou menos tudo
isso. – Ela gargalhou e eu ri junto, eu estava só exagerando.
— Okay, vamos para a
parte do conselho racional.
— Aleluia! – Ela me fez
uma careta e me mostrou o dedo do meio e eu ri, alto, mas ninguém notou dessa
vez, o bar estava começando a ficar mais cheio.
— Você não pode negar um
cargo desse se te chamarem, o salário supera qualquer coisa, amiga, e é só você
tratar ele totalmente profissional, e ele vai entender o recado.
— Será?
— Você precisa encarar isso
amiga, por um salário desses, eu trabalho até lavando banheiro cheio de merda
num presidio cheio de assassinos. E trabalhar com ele não vai ser tão horrível
quanto isso, eu tenho certeza que
não.
— Posso mandar você fazer
o meu serviço e eu só ganhar por você?
— Pode.
— Meu Deus. – E nós duas
caímos na risada.
Peguei meu copo e virei
mais um gole, observando a Avenida Paulista que começava a ficar lenta por
causa do horário do pico, era o horário que todo mundo começava a sair do
trabalho para ir embora.
Estava tão distraída que
demorei para perceber que eu estava olhando, distraída, para um carro e o
motorista do carro me encarava diretamente pelo vidro da frente.
Meu riso foi se esvaindo
aos poucos, e eu congelei na cadeira do bar.
Do outro lado do vidro do
carro, ele me encarava com aquele sorrisinho sacana nos lábios.
Eu estava finalmente
livre, o que era meio raro na minha agenda, mas a Jô andava me dando mais dias
de folga nos dias que não tinha shows, é claro que sempre tinha alguma coisa
para fazer: rádio, TV, sessões de foto, revista, estúdio, marketing, sempre
tinha alguma coisa para eu fazer, agora era época de concentrar bastante no
estúdio e músicas novas, mas eu merecia um pouco de folga e ela sabia disso,
por isso, estava tentando diminuir o ritmo de atividades durante os dias de
semana, assim também, eu tinha mais tempo para ficar com o pessoal de estúdio e
compormos músicas novas.
Eu saí do escritório e
enquanto seguia para meu carro, no subsolo, liguei para o William, um dos camaradas
meus que iam para meu apartamento à noite, para confirmar o horário, aliás, eu
precisava ligar para a Dona Maria para ela aumentar meu estoque de cerveja,
carne e fazer um arroz e maionese, aqueles caras adoravam um churrasquinho,
cerveja e vídeo game/futebol, e claro, falarmos de carro, mulher e futebol.
Pelas minhas contas iam uns cinco, seis amigos, caras que eu conhecia já há
bastante tempo e que sempre que rolava uma folga nas agendas, a gente se via
para colocar os papos em dia.
Entrei no carro e liguei
para a Dona Maria e depois de uns quinze minutos sentado dentro do carro
mexendo no celular, olhando postagens, mandando mensagens e falando com alguns
camaradas, eu finalmente saí do prédio dando de cara com uma Avenida Paulista
já meio engarrafada. Que droga, esqueci o horário de pico.
Não teria jeito, eu tinha
que enfrentar aquilo ali para chegar em casa.
Liguei o rádio do carro e
deixei uma seleção de músicas que eu curtia rolar num som moderado enquanto
dirigia, distraído. Eu não conseguia acreditar que a louca ia trabalhar para
mim, como aquilo era possível? Como ela conhecia a Jô? Que droga, eu tinha
esquecido de perguntar isso a ela, mas não importava, o fato era que a Jô iria
contratá-la para ser minha assistente pessoal e eu passaria a conviver com ela
praticamente vinte e quatro horas por dia, sete dias da semana, eu e aquela
louca. Aquilo ia ser foda!
Soltei uma risada sozinho
enquanto pensava na cena, ela toda nervosinha, que me odiava, me chamava de
filhinho de papai, tendo que agir totalmente normal comigo, sem poder me xingar
nenhuma vez sequer, trabalhar diretamente comigo, falar diretamente comigo, me
ajudar com o nó da gravata, como muitas vezes a Jô fez durante o caminho para
algum evento, se preocupar com o meu descanso, se eu comi direito, se estou com
sede, se descansei, fazer tudo que a Jô fazia, será que depois de tudo isso ela
passaria a me odiar menos? Parecia quase impossível.
Que loucura! Aquilo tudo
estava ficando cada vez mais louco, quem diria, eu atropelo a menina num dia e
no outro ela está na minha sala numa entrevista para trabalhar comigo. Que
ironia do destino.
O transito estava uma
merda agora, literalmente, andava um metro e parava, mais meio metro e parava,
e eu estava ansioso e impaciente dentro do carro, pensando em mil coisas além
da louca; liguei novamente para a Dona Maria em casa, mas ela não atendeu,
provavelmente tinha ido ao mercado repor o estoque para a noite de churrasco e
vídeo game, eu sabia que os caras iam jogar menos e beber e comer mais, mas não
me importava, era só uma noite para relaxar, rever os amigos e falar muita
merda, coisas típicas de homens.
Pelo vidro do carro eu
via as pessoas caminhando apressadas pela calçada, era o horário que a grande
maioria saia do trabalho, alguns barzinhos na Avenida já estavam lotado, e eu
fiquei me imaginando sendo como uma pessoa daquelas, um cara normal, saindo do
trabalho, depois de um dia preso no escritório, e indo para um barzinho com os
amigos curtir um Happy Hour, sem me importar se me reconheceriam, se encheria
de gente a minha volta, se eu correria algum risco sozinho no meio das pessoas,
não, sem nada disso, apenas um cara normal, desfazendo o nó da gravata no
pescoço, sentando numa cadeira, a mesa na calçada, como vários que eu via,
pedindo uma cerveja e rindo com os amigos enquanto falávamos da noite de
futebol que ia rolar na TV, o meu time, zoando o time dos outros, falando de
mulheres bonitas que passavam na rua, ou que trabalhavam no escritório, quem
sabe, sem nenhuma preocupação, apenas um cara comum.
Mas eu nunca seria um
cara comum, não mais, a minha chance disso já tinha passado, e eu tinha
agarrado a chance de não ser um cara comum, mas sim o cara que todo mundo sabia
o nome, sabia quem era e conhecia suas músicas, um cara com uma carreira
artística finalmente solida, com o sucesso estabelecido e reconhecido
finalmente por seu talento, sem desconfianças, sem ninguém dizendo que eu seria
esquecido em seis meses, eu tinha escolhido essa vida e agora não dava para
voltar atrás, e do jeito que a vida era, se eu fosse um cara comum, iria estar
sonhando não ser um cara comum, coisas da vida, como dizem, ninguém nunca está
satisfeito com o que tem, mas eu estava satisfeito, apesar de tudo, apesar de
não ser um cara comum, eu estava satisfeito com a vida que eu tinha.
Estava tão distraído,
parado no transito, pensando numa vida que eu nunca teria, olhando as pessoas
nas mesinhas do bar, na calçada da Avenida Paulista, que mal reparei que eu
estava olhando para uma garota sentada numa das mesas de um barzinho, uma
garota de cabelos louros, longos, escorridos ao lado do rosto, que ria enquanto
conversava com uma amiga, um copo de cerveja estava na mesa a frente dela, e
ela parecia bem à vontade, apenas mais uma garota comum num happy hour despois
do trabalho, como tantos outros, mas não, aquela não era uma garota comum, eu
conhecia aquela garota.
Ah não, de novo não.
Eu vi que ela olhava na
direção do meu carro, mas não parecia ter reparado de fato em mim, fiquei ali,
um minuto inteiro olhando para ela, conversando com a amiga a frente, uma
garota de cabelos pretos, lisos, muito bonita que dizia algo que a fazia rir,
caramba, ela era muito linda, o sorriso dela, a covinha que se formava no rosto
dela quando ela sorria, eu não tinha visto nada disso antes enquanto ela fazia
cara de pittbull para mim e tentava me matar.
Os olhos dela finalmente
se focaram e ela me olhou, o sorriso lindo e a covinha na bochecha foram se
desfazendo como o sol sendo tampado por uma nuvem negra, o sorriso se foi e o
rosto dela ficou sério, me encarando; não aguentei e dei um sorrisinho sacana,
e ergui a mão, dando um tchauzinho.
Ela estava ali, há alguns
metros de distância, tomando uma cerveja com uma amiga, se divertindo, apenas
uma garota comum, e eu senti uma vontade insana de parar o carro e ir até lá,
puxar uma cadeira, sentar e curtir uma cerveja com elas, como um cara comum.
Mas
que droga, o que você está fazendo, Luan?
Encostei o carro no meio
fio, parando atrás de um outro carro estacionado, bem de frente para o barzinho
onde ela estava sentada, e vi que ela agora arregalava ainda mais os olhos, me
vendo parando ali; desviei os olhos dela para olhar direito onde eu estava
estacionando, e então desliguei o carro.
Que droga, o que eu
estava fazendo?
Peguei o celular e liguei
para o Caio, era bom um segurança meu ir ali e ficar perto de mim, por
garantia, mesmo que eu já estivesse em desvantagem desde já.
Ele atendeu no segundo
toque.
— Hey Caio, beleza cara?
— Fala, Luan. Que, que manda?
—
Preciso
de você, urgente, aqui na Paulista, no Happy Hour Pub, sabe onde fica?
— HP Pub? Eu conheço aí. Não me diga que você vai tomar uma cervejinha
sentado numa mesinha na calçada.
Eu ri. Como ele tinha
adivinhado?
— Como você adivinhou? –
Ele ficou mudo por alguns segundos do outro lado da linha, então disse,
enquanto eu observava a louca pelo vidro do carro que era fume, então ela não
podia me olhar naquele momento. Ela estava conversando com a amiga, parecia
meio agitada.
— Não parece uma boa ideia, Luan.
— Consegue chegar em
quanto tempo? Tá um transito dos infernos, vem de moto. Eu estacionei na frente,
estou dentro do carro ainda.
— A Joana vai te matar. – Eu ri. – Não saia desse carro até eu chegar.
—
Você
tem cinco minutos para estar aqui Caio. Tô descendo, tem uma loira me
esperando.
Ouvi um protesto dele do
outro lado da linha e desliguei antes que ele pudesse responder.
Será que me reconheceriam
assim na rua, aparecendo do nada, sem mais nem menos?
Virei para trás, pegando
um boné meu que estava no banco de trás e coloquei na cabeça, tapando os
cabelos e escondendo um pouco meu rosto, puxei os óculos escuros do porta-luvas
do carro e o ajeitei no rosto, eram quase cinco horas da tarde, em breve o sol
se colocaria atrás das nuvens, mas não tinha problema, meus óculos serviam
tanto para o dia quanto para a noite, a intenção era só me disfarçar o máximo
que fosse possível para que as outras pessoas não me reconhecessem.
Enfiei o celular no bolso
e respirei fundo.
Pela primeira vez em anos
eu ia fazer aquilo, sentar numa mesinha de um bar qualquer, como uma pessoa
qualquer.
Aquilo era loucura, mas
eu tinha que fazer aquilo, algo dentro de mim fervia loucamente só de imaginar
a cara dela me olhando ali, sentado na mesma mesa que ela, como uma pessoa
qualquer, eu precisava fazer aquilo.
Seja o que Deus quiser.
Abri a porta do carro e
saí, fechando a porta atrás de mim e apertando o botão do alarme, coloquei a
chave no outro bolso e dei a volta, seguindo em direção a calçada. Quando sai
pela frente do carro e pisei na calçada, vi o rosto dela: ela estava branca
igual cera.
Fingi que era um cara
comum enquanto atravessava a larga calçada da Paulista em direção ao barzinho,
exatamente em direção à mesa dela, o ideal era fingir que eu não era ninguém e
talvez ninguém me notasse de fato.
Ela continuou me olhando
o tempo todo, acompanhando meus passos, e eu dei um sorrisinho sacana, apenas
para provoca-la, eu ia deixa-la mais louca do que ela já era. Percebi que a
amiga dela também estava me olhando, branca igual leite, ambas pálidas, e me
aproximei, finalmente alcançando a mesa delas e parando a frente, vendo a louca
e a amiga erguendo o rosto e me olhando, a louca agora com o rosto menos pálido
e ficando gradativamente vermelha, sinal que ela estava ficando nervosinha.
Dei um sorriso maior, o
maior que eu conseguia, bem cafajeste, sacana e galã de novela e ouvi a amiga
dela arfando com o meu sorriso, mas ela ergueu uma das sobrancelhas e fechou a
cara. Sim, ela estava nervosinha agora.
— Boa tarde, meninas!
Posso me sentar com vocês? – Fiquei parado ali, o bonezinho de lado na cabeça,
os óculos escuros no rosto e o sorriso sacana nos lábios, esperando,
pacientemente, como um cara qualquer que vai pedir para beber com duas moças
bonitas.
— O que você está fazendo
aqui? – Ela finalmente tinha saído do choque de me ver e estava me encarando
com aquela carinha que eu já conhecia muito bem em dois dias, a de “eu vou te
matar”, eu tinha visto essa carinha mais vezes do que o permitido em pouco mais
de vinte e quatro horas.
— Não vai me apresentar
sua amiga? – Ignorei totalmente a pergunta dela e virei o rosto para encarar a
amiga dela que estava me olhando, meio pálida e todo sorrisos, era muito
bonita, mas eu realmente não estava interessada nela, mas sim numa louca, maluca,
que parecia que ia me matar todas as vezes que me via. Parecia que eu estava
começando a gostar de deixa-la nervosinha e com vontade de me matar.
— Você enlouqueceu? E você
não pode ficar andando pela rua assim, pode? – Virei o rosto e a encarei, o
sorriso aumentando no rosto.
— Quem te disse que não
posso? – Ela ergueu as duas sobrancelhas, fazendo cara feia e eu ri, fazendo
menção de me abaixar para cumprimentar a amiga dela e ela se levantou, agora
parecendo mais normal do que antes, sorrindo:
— Prazer, Julia. Sou
amiga dessa...
— Louca. – Eu concluí a
frase da menina e ela riu, fazendo a louca em si fechar mais a cara para mim,
me deu um beijo no rosto enquanto eu dizia. – Luan. – Eu disse, simplesmente,
era melhor não falar o nome inteiro ali, no meio de todas aquelas pessoas.
— Parece que você já
conhece bem a Mel, mesmo em tão pouco tempo.
— Dá para perceber de
longe que ela é louca. – A amiga dela riu novamente e ela me olhou, erguendo as
duas sobrancelhas e me encarando, séria e brava. Caramba, como ela ficava linda
brava, mas era ainda mais linda sorrindo, lembrei das covinhas dela.
— Senta com a gente. –
Disse a amiga, puxando uma cadeira de uma mesa ao lado e colocando atrás de
mim, eu agradeci e ajeitei a cadeira, me sentando, olhei para a louca que
estava me encarando, ainda séria, com as duas sobrancelhas erguidas.
— Vocês curtem um Happy
Hour, então? – Eu perguntei, simpático, olhando para ela e para a amiga dela.
— Não com você. – A louca
respondeu, secamente e eu soltei uma risada. Ela era hilária, cara. Incrível.
— Caramba, como você é
difícil. – Eu disse entre risos e me virei para a amiga dela. – Ela é sempre
tão difícil assim ou é só comigo?
— Ah, é só com você
mesmo, normalmente ela é mais fácil que folhas secas no outono.
— Júlia! – A louca disse, repreendendo a amiga que riu, e eu ri
junto.
— Ah, folhas secas é um
termo que combina muito bem com ela;
— Engraçado, ela costuma
ser sempre tão doce, você realmente feriu os sentimentos dela. – Soltei uma
risada e me virei para olhar a amiga dela, ignorando totalmente a louca,
enquanto conversávamos sobre ela como se ela nem estivesse na mesma mesa.
— É mesmo? E o que eu
faço para ver esse lado doce dela?
— Eu estou aqui! – Ela
disse, mas eu fingi que nem ouvi, a amiga dela deu uma risadinha, mas continuou
conversando comigo.
— Olha a situação parece
estar meio difícil para o seu lado, você vai ter que soar um pouquinho para
conseguir amansar ela.
— Tipo, ir à lua e
voltar. – Ela disse e eu não consegui ignorá-la mais e soltei uma risada alta
demais que eu acho que o bar inteiro ouviu e me reconheceu.
— Você me adora, né! –
Ela soltou uma gargalhada irônica.
— Sou sua fã número um,
sabia? Tenho milhares de pôsteres com seu rosto colado pelo quarto inteiro.
— Afiada como um machado
cego, acho que é o termo mais adequado. – A Júlia, amiga dela, riu quando eu
disse isso.
— Luan, quer beber com a
gente? Vou pedir mais um copo e mais uma cerveja. – Ela disse, e eu agradeci. –
Vou ir buscar, melhor, assim o garçom não te reconhece.
— Pelo menos alguém é
educado por aqui, viu só? Quer aprender com a sua amiga? – A louca deu um
sorrisinho irônico, sem nem mesmo mostrar dentes, e ficou me encarando, com as
sobrancelhas erguidas, enquanto a amiga dela se levantava para buscar a cerveja
e o copo.
— Afinal de contas, o que
você está fazendo aqui? Tá me seguindo? – Eu soltei uma risada alta e ela ficou
me encarando, séria. – A sua assessora sabe que você está aqui?
— Você é minha nova assessora, e você sabe que eu estou aqui, então,
não tem problema. – Eu disse, queria ver a reação dela de primeira mão ao saber
que iria trabalhar diretamente comigo.
— Eu não sou sua assessora. Ficou maluco? – Ela abaixou o tom de voz ao
dizer isso, mas foi incisiva o suficiente, eu me inclinei para o lado dela e
abaixei a voz também, ao responder.
— Maluco de pedra por
deixar a Jô contratar você, mas você me atiça. – Dei um sorriso sacana e ela
fez cara de brava para mim, o que me fez rir mais ainda.
— E você dá em cima de
todas as mulheres que trabalham com você?
— De onde você conhece a
Jô? – Eu ignorei a pergunta dela e ela deu de ombros, recostando na cadeira
novamente e me deixando ali, inclinado, mas sem ela perto de mim, por isso,
voltei a me sentar normal também, me recostando na minha cadeira.
— Não te interessa. – Ela
respondeu, secamente, pegando o copo dela e dando um gole na cerveja que
parecia agora estar meio quente. – E eu não vou trabalhar para você. Nem que a
vaca tussa.
Eu ri e fiquei olhando
para ela, ela me olhou de volta e ergueu uma das sobrancelhas.
— A vaca está prestes a
aprender a tossir. – Ela mostrou a língua para mim e eu ri novamente.
— O que você está fazendo
aqui? – Como ela era difícil. Ajeitei o boné na cabeça e ela revirou os olhos.
— Parei para tomar uma
cervejinha com uma louca linda que é minha nova assistente e diz que quer me
matar, mas no fundo me adora!
— Com certeza te adora! –
A amiga dela tinha voltado, estava com uma garrafa de cerveja na mão e um copo
na outra. Ela depositou o copo na mesa a minha frente e o encheu até a boca,
depois serviu o copo da louca e o dela, colocando a garrafa sobre a mesa. –
Nova assistente? Epa, essa eu não sabia?
Ela olhou para a louca
que deu de ombros e não disse nada; eu aproveitei a minha chance.
— Eu vim especialmente
para contar para a louca que o cargo é dela.
— Louca? – Ela e a amiga
indagaram ao mesmo tempo, mas o tom de voz das duas eram completamente
diferentes, eu não disse nada e a Julia começou a rir, enquanto a louca ficava
me olhando com cara feia.
— Louca é a sua mãe.
— Coitadinha da minha
mãe, ela não é nada parecida com você. – A Julia ainda estava rindo. Ergui as
duas mãos no alto, como quem se rende e disse: – Desculpa, eu peguei a mania de
te chamar de louca, como é mesmo o seu nome?
Mellissa. Eu sabia que o
nome dela era Mellissa, mas estava apenas irritando ela. A Julia pareceu notar
e soltou outra gargalhada.
— Quer parar de dar bola
para esse idiota, Ju! Você tinha que estar do meu lado! – A amiga dela repetiu
o meu gesto, erguendo as mãos, na defensiva.
— Desculpa amiga, mas ele
é engraçado.
— Engraçado como um
palhaço assassino. Não tem graça nenhuma vocês dois zoando com a minha cara.
— É que você atiça meu
lado provocador.
— E você atiça o meu lado
assassino. – Soltei uma gargalhada, e peguei meu copo, virando um gole de
cerveja gelada e saboreando-a por um segundo.
Ah, como era bom ser um
sujeito normal por pelo menos poucos minutos.
—
Eu mecho com você, não é? – Ela suspirou, novamente, meio irritada e a Julia
emendou, o que deixou a Melissa mais irritada ainda.
—
Humm, acho que eu estou sobrando aqui.
—
Ju! – Eu e a Julia rimos, cumplices,
e a Melissa virou-se para mim, com aquele ar de brava, nervosinha, assassina.
Caramba, como ela me deixava louco quando ficava irritada. Aquilo era
humanamente normal? – Quer saber, você meche comigo sim, você meche muito comigo, você me deixa louca... –
Nesse momento ela fez uma voz sensual e eu olhei para ela, sentindo algo
esquentando em mim, ela continuou com a voz sexy. — de vontade... – Eu suspirei
e me inclinei um pouquinho mais para a frente, na direção dela. — De estrangular
você. Não, estrangular é pouco, a minha vontade é de dar um soco nessa sua
carinha linda e afundar ela inteira.
—
Nossa, quanta agressividade. Você disse “carinha linda”? – Eu e a Julia rimos
novamente, juntos e ela respirou fundo, pegando o copo de cerveja e virando um
grande gole.
—
Eu desisto. Você só quer me irritar, né.
—
É o meu novo prazer, te ver irritada. – Eu disse e ela fez uma careta, o que
fez a Julia soltar um “Hummmm”, bem na hora que o Caio se aproximava da mesa,
parando ao meu lado.
—
Luan.
—
Fala Caio! Senta aí com a gente e bebe uma cervejinha.
Ele
não pareceu nada feliz com aquela frase, mas eu vi ele se virando para pegar
uma cadeira na mesa ao lado, a Julia olhou para o Caio e depois olhou para a
Melissa, eu vi os olhos dela brilhando ou foi impressão minha?
Acho
que no fim das contas, aquela tarde ia ser bastante produtiva.
Alguém
pode me acordar desse pesadelo?
Eu pensei que o azar
tinha acabado depois de dormir e acordar para mais um novo dia, mas parecia que
eu estava enganada, ou então, eu ainda estava dormindo e estava tendo um
pesadelo muito longo e interminável com esse idiota, babaca, que estava me
seguindo até em sonhos agora.
Que droga.
A coisa toda era um
absurdo, eu estava sentada num barzinho, na Avenida Paulista, bebendo cerveja
com minha melhor amiga, e na nossa mesa estava sentado o Luan Santana e agora
um amigo dele se juntava a gente, como se isso tudo fosse a coisa mais comum e
normal do mundo, eu nem sabia que ele podia ficar andando na rua assim, como
uma pessoa normal, e se podia, com tantas mesas naquele bar, por que ele tinha
que sentar justo na minha e ficar me irritando o tempo todo?
Eu peguei a garrafa de
cerveja e enchi mais uma vez o meu copo, coloquei a garrafa na mesa e virei um
grande gole de cerveja em seguida, do jeito que aquilo estava uma loucura, acho
que era melhor eu mudar a cerveja para uma tequila já, para ver se as coisas
melhoravam para mim, ou se pelo menos, eu melhorava, porque o vulcão assassino
estava de volta, e bastava apenas a presença dele para isso acontecer.
O tal Caio, amigo do
idiota, puxou uma cadeira e sentou a nossa mesa, do outro lado, ficando de
frente para o Luan, eu vi a Julia dar uma olhada no cara e depois olhar para
mim, dando um sorrisinho. O cara era bonitão, era alto, mais alto do que o
Luan, e olha que ele era alto, era forte, musculoso, do tipo que devia passar
horas e horas na academia puxando peso, era loiro, o cabelo era curto, estilo
militar e ele era bem branquinho, tinha um rosto bonito e os olhos meio esverdeados,
era muito bonito e a Julia pelo jeito tinha gostado dele tanto quanto ela
gostava do Luan, provavelmente, eu conhecia aquela menina bem o suficiente para
saber disso.
— Seu amigo, Luan? – A
Julia interesseira que só, perguntou, ela já parecia tipo best friend do
idiota, toda, toda para o lado dele, agora ia ficar toda, toda também para o
lado do bonitão musculoso.
— Sim, e também meu
segurança pessoal. – Ele disse, dando um sorriso para o cara e em seguida
apontando para mim e para a Julia. – Caio, essa é a Melissa, minha nova
assistente pessoal...
— Só que não. – Eu disse,
interrompendo-o, ele me lançou um olhar, meio sério, pela primeira vez, mas
continuou.
— E a amiga dela, Julia.
– O bonitão sorriu e se levantou, se inclinando sobre mim e me dando um
beijinho no rosto.
— Prazer. - E depois indo
para o lado da Julia e dando um beijo um pouco mais longo, eu acho, no rosto
dela, o beijo foi um pouco mais longo porque a Julia segurou o rosto do rapaz.
— Meu Deus, que cheiroso.
Minha nossa senhora, essa
menina me faz passar vergonha alheira.
Abaixei a cabeça e neguei
de leve e percebi que o idiota estava dando um sorrisinho, ergui o rosto e o
encarei, erguendo uma das sobrancelhas.
— Se acostume com o Caio,
ele é um dos meus seguranças mais próximos. Ele me acompanha direto.
— Eu não sou sua
assistente. – Eu disse, quando é que ele ia entender isso? Primeiro, a Joana
não tinha me ligado e dito que eu fui aprovada para a vaga, segundo, eu não
tinha aceitado também, então, eu não era nada dele, ele não tinha que ficar
bancando meu novo chefe.
Se eu aceitasse, ele
seria meu chefe?
Que merda! Aquilo piorava
tudo em número, gênero e grau.
Eu não ia mais poder
xingar ele...
E nem ter nada com ele.
Essa voz idiota parecia a
Julia falando.
Cala
a boca, sua idiota, eu NÃO quero ter nada com ele. Se liga.
— Acredite, você é. – Ele
respondeu, simplesmente, dessa vez sem sorrisinho sacana e nem de galã, o que
foi um milagre.
Desviei a atenção dele e
vi a Julia conversando com o segurança bonitão que chamava Caio.
— E você faz tudo isso? –
Ela adorava homens fortões, tipo, ela era louca por fortões e agora tinha um
super fortão e lindo do lado dela, então imagine, ela nem devia estar lembrando
do outro que mandou flores para ela hoje mesmo.
Outro? Que outro?
O cara deu um sorrisinho.
— Comecei a fazer Judô
muito pequeno, artes marciais veio quando eu era adolescente, uma consequência.
– O Luan deu um sorriso.
— Esse cara é campeão em
Artes marciais, e também é lutador de MMA.
— Ex lutador. – Ele
sorriu, olhando para o Luan, depois voltando a atenção para a Julia. – Parei
tem alguns anos, agora me dedico apenas a segurança do meu chefe. – O Luan riu
e negou com a cabeça de leve, mas não disse nada.
— E você parou de lutar
por que? – Eu perguntei. Como um cara que é lutador decide virar segurança de
alguém? Claro que ele devia ganhar bem sendo segurança pessoal do Luan Santana,
mas aposto que lutar era uma paixão para ele.
— Há uns três anos quase
matei um cara no MMA, é uma luta muito dura. Depois disso decidi parar, agora
luto apenas por hobby nas horas vagas. – Me senti abrindo a boca e fiquei
encarando-o por um tempo, a Julia não pareceu se importar muito com a parte do
cara quase ter matado outro lutando, ela estava mais interessada na força que
ele tinha para fazer isso.
— Meu Deus! Você é mesmo
muito forte então! – Ela estava se derretendo mais do que picolé exposto ao
sol.
Revirei os olhos e
desviei a atenção dos dois antes que eu vomitasse. Olhei para o Luan e ele
estava me olhando, sorrindo. Se inclinou para o meu lado e falou, baixinho.
— Acho que ela gostou do
Caio. – Eu dei uma risadinha e neguei com a cabeça.
— Ela gosta de lutadores.
– Eu não podia dizer que ela curtia fortões ou ele ia se achar também né,
porque bem ou mal, eu não podia negar que o Luan tinha um belo corpo, umas costas
e tanto e era bem forte também. Mas eu não ia assumir isso nem que a vaca
tossisse de verdade.
— E você, gosta de
cantores? – Eu soltei uma risada, inesperada, pensei que ele ia perguntar se eu
gostava de lutadores, e ele sorriu de volta.
— Meu Deus, ela está
rindo comigo. Alguém filma isso porque é um milagre! – Revirei os olhos, ainda
meio sorridente.
— Babaca! – Eu disse e vi
o sorriso dele aumentar ainda mais. Que ótimo, ele gostava que eu o xingasse, que filho da puta!
Olhei para a Julia quando
ouvi uma risada alta ecoando. A filha da mãe estava dando em cima do segurança
bonitão do Luan.
Que maravilha.
— Mel, ele disse que vai
me ensinar defesa pessoal, isso não é demais? – Ela falou comigo porque eu
estava olhando para ela.
Ah, eu já imaginava como
terminaria aquela aula de defesas pessoais, com ela deitada e o cara por cima
dela, se é que você me entende.
Eu ri, mais dos meus
pensamentos do que dela, mas ela pensou que era para ela e riu junto.
— Mel? – O Luan disse e
eu virei o rosto, olhando para ele. – De doce, você só tem o nome, né? – Fiz
uma careta e mostrei a língua para ele, que riu, gostosamente.
— Na verdade, eu sou
mesmo uma doçura, só com você que não. – Ele colocou a mão no coração e fez
cara de triste.
— Ai, essa doeu. – Eu ri,
ele era um babaca, idiota mesmo. – Não vou poder provar desse mel então?
Soltei uma gargalhada.
Que cantada mais ridícula.
— “O Mel dos seus beijos,
tem gosto de amor...” – Ele cantarolou baixinho e eu comecei a rir. Deus, ele
era mesmo muito idiota.
Percebi que a Julia
estava rindo também, e desviei os olhos para o segurança, esperando ver ele
sorrindo também, mas ele não estava sorrindo, ele estava olhando a volta, meio
sério, foi então que eu percebi, uma menina na mesa ao lado estava olhando para
o Luan, e parecia ter reconhecido ele.
Que droga.
— Luan, melhor irmos
indo.
O Luan assentiu, e se
virou para mim, e sorrindo sacana, novamente. Lá vem o filho da mãe bancar o
espertinho.
— Quer uma carona, Mel?
Ergui as sobrancelhas e
fechei a cara.
Idiota.
— Não, obrigado, eu vou
com a Julia, né Ju? – Olhei para a frente e lá estava ela, aos risinhos com o
segurança novamente.
— Han? Ah, Mel, é que o
Caio disse que vai me dar uma carona de moto, não é Caio? – Ela lançou um olhar
sedutor para o bonitão e eu revirei os olhos.
Filha da mãe.
O Luan sorriu.
— Eu não vou te morder,
até porque, não posso morder meus funcionários. – Ele deu uma piscadinha e eu
senti vontade de matar ele, pela milionésima vez.
Eu estava completamente
fodida, ferrada e MUITO bem paga.
Que merda.
Como eu ia embora?
— Tudo bem. – Eu disse, a
contragosto e vi ele enfiando a mão no bolso da calça e puxando a carteira do
bolso. Abriu ela e tirou uma nota de cem reais e colocou na mesa, esticando na
direção do Caio, que olhou para ele e segurou a nota em seguida.
Aquilo era um exagero,
duas cervejas e uma porção de batatas-fritas não tinha dado nem trinta reais.
— Paga a conta e pode
tirar a noite de folga. Eu vou dar uma carona para a senhorita estressadinha e
vou para casa.
— Senhorita
estressadinha? – Eu disse, erguendo uma das sobrancelhas e ele riu, dando de
ombros.
— Combina com você, e eu
acho que a Jô vai gostar do apelido. – Revirei os olhos enquanto ele ria e se
levantava da mesa.
Quando ele se levantou eu
vi a menina na mesa do lado olhando mais para ele, definitivamente ela tinha
reconhecido ele, estava puxando o celular da bolsa e cochichava com a amiga ao
lado, que virava para olhar para nós. O tal Caio pareceu notar e se levantou em
seguida.
Ótimo, era melhor ir
embora logo, já que eu era a nova assistente dele, infelizmente, tinha que manter a vida dele em preservação e ele são
e salvo.
Contra a minha vontade,
mas tinha.
— Vamos logo antes que te
reconheçam, te deixem nu na rua e eu perca o emprego que eu nem consegui ainda.
— Você iria adorar me ver
nu, pode apostar. – Fiz uma careta e dei um tapa no braço dele, empurrando-o em
direção ao carro, o que ele fez rindo.
Meu Deus, que braço!
Ele era mesmo forte, meu
Deus!
Isso é só uma observação
idiota da minha mente idiota.
Ele enfiou a mão no bolso
da calça e tirou a chave do carro, apertando o botão do alarme e seguiu até a
porta do passageiro, abrindo-a e segurando para mim.
Parei perto do carro,
vendo ele segurando a porta e o olhei, ele sorriu, não irônico ou sacana, um
sorriso bonitinho e gentil, o que era até estranho vindo dele, e eu desviei os
olhos.
Nem
começa a querer achar ele legal, Mellissa, ele ainda é um babaca idiota, e o
pior, agora é seu chefe...
Entrei no carro e ele
fechou a porta, dando a volta e entrando do outro lado. Eu coloquei minha bolsa
no chão e puxei o cinto de segurança, vendo ele se ajeitando no banco e também
puxando o cinto de segurança sobre ele.
Ele não ligou o carro de
imediato, e olhei para ele, a princípio pensei que ele estava me olhando porque
ele estava olhando na minha direção, mas não, ele estava olhando pelo vidro do
meu lado, vendo o Caio pagando a conta ao garçom e segurando a Julia pela mão,
seguindo pela calçada no sentido contrário de onde estávamos.
Hey, ele puxou a Julia
pela mão!
Que filha da mãe esperta.
Como ela conseguia isso tão rápido?
Fiquei chocada, mas não
disse nada e virei o rosto, agora ele estava mesmo me olhando, ergui uma das
sobrancelhas e ele deu uma risadinha.
— A sua amiga é esperta.
— Você não faz ideia do
quanto. – Ele riu, e eu decidi mudar o assunto antes que ele voltasse com as
cantadinhas idiotas.
— Melhor irmos andando, a
Joana vai morrer se souber que você estava num bar comigo e que eu deixei você ser reconhecido, sem nem mesmo ter sido
contratada.
— Ela não vai saber. –
Ele disse, dando partida no carro e engatando o carro no câmbio automático, e
saindo em direção à Avenida Paulista, agora com o transito um pouco mais
tranquilo do que um tempo atrás.
Olhei para ele e franzi a
testa, e ele completou, sem me olhar.
— Você não conhece ela,
ela te demite antes mesmo de te contratar se pensar que eu estou te paquerando.
– Ele soltou uma risada e eu franzi a testa. Ele estava me paquerando?
— E você está me
paquerando? – Eu perguntei, e ele desviou os olhos da rua e me olhou, dando um
sorrisinho sacana.
— E se estivesse?
— Eu te mandaria para o
inferno. – Ele soltou uma gargalhada gostosa e assentiu a cabeça.
— Foi por isso que a Jô
te contratou, porque se eu te paquerar, você não vai se derreter como qualquer
outra faria.
— Só por isso? – É sério?
Eu tinha sido contratada apenas porque eu odiava ele? Tá de brincadeira, achei
que era porque eu era muito boa e meu currículo era exemplar.
Ele percebeu meu tom de
voz decepcionado e negou com a cabeça enquanto respondia.
— Claro que não, o seu
currículo supera qualquer um que eu já tenha visto na vida. Quem mais fala
quatro línguas fluentemente?
Revirei os olhos, mas
suspirei aliviada.
— Como que diz em alemão a
frase: “Você me deixa louco quando fica nervosinha”? – Virei o rosto e o
encarei, erguendo as sobrancelhas, totalmente estupefata, e então deixei escapar
um “Vai se ferrar”, totalmente exasperada e ele soltou uma gargalhada alta. –
Ah cara, você é demais!
Acabei não aguentando e
comecei a rir junto.
Como ele era idiota!
— Você é um idiota! – Eu
disse, entre risos. Quem diria, eu estava rindo com ele.
— Você é linda sorrindo,
sabia? Devia sorrir mais vezes. – Eu fiz uma careta para ele, e ele riu, ele estava
me provocando, eu sabia disso.
— Só sorrio para as
pessoas que eu gosto, e você não está na listinha delas. – Ele fez uma carinha
de magoado, e eu me segurei para não rir.
— Que pena; você tem uma
covinha linda! – Ele tinha reparado na minha covinha, que lindo... Revirei os
olhos e fiz uma careta.
— Você gosta de covinhas?
– Ele assentiu, sorrindo, meio galã, o que eu achei completamente babaca, aposto
que ele estava fazendo de propósito.
— Ah sim, adoro covinhas.
— É mesmo? Eu também
adoro covinhas. – Eu comecei e vi que ele foi diminuindo o sorriso de galã,
desviou os olhos da rua e me olhou, franzindo a testa e com ar de desconfiado.
– Adoro tanto covinhas que até cavei uma para você.
Ele soltou uma gargalhada
tão alta que com certeza todos os carros a volta ouviram, eu estava rindo sem
nem perceber, era uma piadinha idiota, mas eu não podia perder a oportunidade,
era a cara dele.
— Definitivamente, você
me adora!
— Do mesmo jeito que
adoro funk e piriguetes de shortinho no meio da bunda. – Ele soltou outra
gargalhada.
Ouvi um barulho do meu
celular vibrando e me inclinei para a frente, abrindo o bolso onde tinha
guardado o meu precioso, com medo de perde-lo novamente, e vi ele me olhando,
sem dizer nada.
Olhei para a tela e vi
que era um número desconhecido. Deslizei o dedo pela tela e atendi.
— Alou!
— Mellissa? – Era a Joana. Virei o rosto e olhei para ele, que tinha
acabado de parar o carro num farol e me olhava.
— Oi Joana. - Eu vi ele
abrir o maior sorriso sacana nos lábios, enquanto eu ouvia a Joana dizer do
outro lado da linha que ela e a Ana Paula tinham gostado muito de mim e me
queriam na equipe. Que maravilha!
Eu não podia recusar
aquela merda de vaga, eram quinze mil reais, você tem noção do que é isso? É
tipo muito maior que todos os salários que eu já ganhei na vida mesmo juntando
todos eles, maior do que eu sequer já sonhei ganhar na vida, em um ano eu teria
um total de cento e oitenta mil reais. Minha nossa Senhora!
Não tinha jeito.
Eu ia trabalhar com
aquele idiota, babaca, otário que estava me olhando e sorrindo sacana porque
ele sabia disso.
Que raiva! Olha a merda
que eu tinha me metido.
O Luan Santana seria o
meu chefe!
Quando deliguei o celular
e o coloquei de volta na bolsa, ele aumentou o sorriso.
— Te vejo segunda, então?
– Eu suspirei. A partir daquele momento eu não podia mais mandar ele ir para o
inferno?
Que droga!
— Não posso mais te
mandar para o inferno, ou ir se ferrar? – Ele soltou uma gargalhada e concordou
com a cabeça.
— Ah, eu vou adorar, na
verdade! – Ele deu uma piscadinha sexy, e eu revirei os olhos.
Não podia acreditar
nisso.
Naquele momento então, eu
estava pegando uma carona com meu novo chefe, que tinha me atropelado no dia
anterior, e que eu tinha vontade de matar desde então.
Voltei a mim com a voz
dele ecoando, risonha.
— Seja bem-vinda a
família Luan Santana.
Ele tinha tirado os
óculos escuros e eu fiquei olhando para ele por um tempo pensando: Caramba, é
mesmo o Luan Santana.
Quer dizer, eu já sabia
disso, mas acho que a ficha só caiu agora.
Eu não era fã do cara nem
nada, mas ainda assim, eu estava dentro do carro de um dos cantores mais
famosos do Brasil, mais amado, mais idolatrado, que tinha mais fãs do que era
possível imaginar e eu estava oficialmente trabalhando para ele.
Como a minha vida tinha
virado essa loucura toda em dois dias?
Voltei a mim vendo ele me
olhando e erguendo as sobrancelhas, ele riu e eu desviei os olhos, me lembrando
do que ele tinha dito.
— Ah, que maravilha, vou
protagonizar o novo filme “Quero matar meu chefe”. – Ele começou a rir,
avançando quando o sinal abriu.
— Meu Deus, você me odeia
mesmo?
— Ah, você não faz ideia.
– Eu respondi, sem pensar, e vi ele desviar os olhos da rua e me encarar, agora
sem risinhos, nem deboche, nem nada.
— Foi mal, não foi minha
intenção te fazer me odiar.
— Mas conseguiu. – Eu
respondi de imediato novamente e me lembrei que eu ia ter que parar de odiá-lo
tanto agora que iria trabalhar para ele.
Será que eu iria
conseguir?
— Podemos começar do
zero?
— Difícil esquecer que
você me fez andar com a bunda de fora pela Paulista.
— Como é? – Ele
perguntou, meio sério e preocupado e não acreditando, desviando os olhos da rua
a frente para me olhar e eu comecei a rir.
Ele não sabia disso, e
era melhor nem saber, né?
— Caramba, melhor eu ir
mais rápido embora, você está rindo comigo, vai cair um temporal e alagar a
cidade inteira.
Eu gargalhei e fiz uma
careta.
— Vai se ferrar.
Ele estava seguindo o
caminho que levava ao meu apartamento e isso era um absurdo, ele sabia mesmo
onde eu morava. Dava até medo uma coisa dessas.
Ficamos quietos por um
tempo, então ele finalmente falou:
— Me desculpe. - Virei o
rosto e o encarei, franzindo a testa. – Para você ficar com tanta raiva de mim
como ficou, eu devo ter feito algo pior do que imagino para você.
Ah, você nem imagina.
— O incidente acarretou
milhares de coisas que acabaram com meu dia.
— Culpa minha. – Ele
disse, com a voz meio derrotada. Deu dó, mas eu disse, com ênfase.
— Toda sua. – Ele me
olhou e riu.
— Poxa, pensei que você ficaria
com pena de mim e diria “não foi culpa sua”. – Eu soltei uma risada e neguei
com a cabeça.
— Não vá pensando que eu
vou passar a mão na sua cabeça quando fizer algo errado, porque isso nunca vai
acontecer. Eu vou te fazer morrer de culpa. – Ele sorriu, de orelha a orelha.
Estávamos entrando na
minha rua.
Que rápido.
Ele diminuiu a velocidade
e parou o carro em frente do meu prédio.
Então desligou o carro e
se virou, me olhando.
Eu não me mexi por um
tempo, apenas virei o rosto e o encarei de volta.
— Acho que a Jô tem
razão, você vai me colocar no meu lugar direitinho. – Eu dei uma risada, mas
não disse nada sobre isso.
— Obrigado pela carona.
— E se eu estivesse? –
Ele perguntou do nada e eu franzi a testa, o encarando.
— Estivesse o que?
— Te paquerando. – Ergui
uma das sobrancelhas e fiquei olhando para ele, então ele riu, gostosamente.
— Babaca!
— Eu sou seu chefe agora,
heim. – Fiz uma careta e revirei os olhos, puxando minha bolsa do chão. Tirei o
cinto e fui me virando para abrir a porta, quando senti a mão dele, de repente,
na minha perna e me virei, encarando ele com as sobrancelhas erguidas.
— Podemos recomeçar do
zero? – Fique ali, parada, olhando para ele.
Ele era meu novo chefe,
eu ainda sentia muita raiva dele por tudo que ele tinha feito, e me feito passar pelo quase
atropelamento, mas eu não poderia mais xingar ele, odiar ele e querer que ele
morresse, não na frente da Joana, ou enquanto estivesse trabalhando. Além do
mais, aqueles quinze mil reais no fim do mês, seriam pagos por ele, e se tudo
aquilo fosse um começo para recompensar por tudo que ele tinha feito?
Eu sabia que ia precisar
me esforçar para esquecer a raiva que eu sentia dele por tudo, mas não tinha
outra alternativa.
— Eu ainda vou te mandar
ir se ferrar. – Eu disse, e vi o sorriso dele se abrindo no rosto, de orelha a
orelha.
— Eu ainda vou te
provocar.
— Eu ainda vou te chamar
de idiota. – Ele riu, a mão dele continuava na minha coxa, eu não olhei para
ela, mas ainda sentia ela lá, quente, firme e forte. E gente! Aquilo fazia uma
onda de calor subir pelo meu corpo inteiro, vindo da palma da mão dele e se
espalhando como labaredas pelo meu corpo.
O que era aquilo, afinal
de contas?
Ele ficou me olhando, com
aquele sorriso lindo nos lábios e eu engoli em seco, sem conseguir me mover no
banco de couro do carro dele.
— Te vejo segunda, então?
– Eu sorri, sem jeito, sentindo o calor das labaredas ainda percorrendo meu
corpo, eu estava começando a ficar sem ar.
— Fazer o que, né? – Eu
disse, brincando, e ele riu, se inclinando sobre mim, eu gelei por dentro e
fiquei paralisada.
Ele apoiou a outra mão no
encosto atrás de mim e tocou os lábios lentamente e bem devagar no meu rosto,
me dando um beijo, e eu me senti prendendo a respiração, parada, congelada no
banco, vendo o Luan Santana inclinado sobre mim, beijando o meu rosto.
Ele afastou um pouco o
rosto e me olhou, estava tão perto que nossos narizes quase se tocavam.
Eu senti ele se
aproximando lentamente, um pouco mais, e, sem saber porque, me vi fechando os
olhos.
Aquilo era loucura, mas o
Luan Santana, o meu chefe, iria me
beijar?
Meu Deus, o que eu iria
fazer?
Notas da Autora:
E aiii, o
que acharam? Gostaram?
Ela vai
trabalhar com o Luan, meu Deus, quem mais ai quer uma profissão dessas???
Que sonho
né... pena que isso não acontece comigo só porque eu escrevi L
Kkkkkkk
Me digam o
que acharam
Acompanhem também essa fanfic no site
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e no Social Spirit
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Beijoss
Lanah